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Cássia Eller, que faria 60 anos hoje, 'tinha o blues', como mostra álbum inédito com guitarrista Victor Biglione

Por G1 em 10/12/2022 às 11:43:21
Gravado há três décadas, mas arquivado na época, o disco expõe a grandeza do canto da artista morta em 2001. Capa do álbum 'Cássia Eller & Victor Biglione in blues', gravado entre 1991 e 1992 pela cantora Cássia Eller (1962 – 2001) com o guitarrista Victor Biglione

Paulo Ruy Barbosa com arte de Emerson Ferreira

Resenha de álbum

Título: Cássia Eller & Victor Biglione in blues

Artistas: Cássia Eller e Victor Biglione

Edição: Universal Music

Cotação: ? ? ? ? ?

? Existe expressão em inglês, I get the blues, que pode designar tanto um melancólico estado d'alma quanto a habilidade de um intérprete para expressar toda a dor e alma contidas no blues, gênero matricial da música norte-americana. Ter o blues – em tradução tão literal quanto poética para o português – é trunfo de raros cantores.

Cantora que hoje faria 60 anos, Cássia Rejane Eller (10 de dezembro de 1962 – 29 de dezembro de 2001) carregava o blues na alma e na voz situada inicialmente em território marginal antes de ser convertida ao pop radiofônico a partir de 1994 pela força da indústria do disco.

Guitarrista argentino radicado no Brasil desde a infância, Victor Biglione percebeu que Cássia Eller tinha o blues quando a ouviu citar I've got a feeling (John Lennon e Paul McCartney, 1970) na introdução da balada Por enquanto (Renato Russo, 1985) em gravação feita para o primeiro álbum da cantora, Cássia Eller (1990). Tanto que, em 1991, Biglione a convidou para ser a intérprete do disco de blues que planejava fazer no Brasil.

Gravado entre o fim de 1991 e o início de 1992 nos estúdios da gravadora PolyGram, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), Cássia Eller & Victor Biglione in blues chega ao mundo após 30 anos e algumas versões divergentes sobre a razão de o disco ter sido arquivado na época.

O álbum sai hoje, 10 de dezembro de 2022, dia do 60º aniversário de Cássia Eller, e mostra que, sim, a cantora tinha o blues. Basta ouvir Same old blues (Don Nix, 1969) – uma das oito faixas gravadas com a voz de Cássia Eller (dois medleys instrumentais completam o repertório do disco) – para identificar no canto da intérprete carga ancestral que embute um desespero, um lamento que traduz o espírito do blues.

Remasterizado com o habitual requinte pelo engenheiro de som Ricardo Garcia, mestre do ofício, Cássia Eller & Victor Biglione in blues é disco sem prazo de validade. Um grande álbum centrado na voz e na guitarra de Victor Biglione, cujos solos são feitos com alma sem que o músico jogue nota fora somente para evidenciar o notório virtuosismo.

Embora sobressalente, o duo está em boa companhia no álbum. Além dos toques de músicos como Marcos Nimrichter (órgão) e Ricardo Leão (teclados), os arranjos criados por Biglione incluem eventualmente – como em I ain't superstition (Willie Dixon, 1962) e na citada Same old blues – poderoso naipe de metais soprados por Bidinho (trompete), Chico Sá (sax tenor), Serginho Trombone (1949 – 2020) (trombone), Zé Carlos Ramos, o bigorna (sax alto) e Zé Nogueira (sax alto e soprano), instrumentista que assina a produção musical do álbum com Victor Biglione.

Victor Biglione e Cássia Eller na imagem tratada para a capa do álbum 'Cássia Eller & Victor Biglione in blues'

Paulo Ruy Barbosa / Divulgação

Dos oito temas cantados por Cássia, um já fazia parte da discografia oficial da artista em vida. É If six was nine (Jimi Hendrix, 1967), blues gravado em O marginal (1992), álbum feito na sequência da gravação com Biglione que acabou se tornando o segundo título da discografia de Cássia.

As audições de gravações como as de I'm your hoochie cooche man (Willie Dixon, 1954) – standard de Muddy Waters (1915 – 1983) – e When sunny gets blues (Marvin Fischer e Jack Segal, 1956) mostram que Biglione tinha razão ao ter vislumbrado a viabilidade de carreira internacional para Cássia Eller com este disco de blues.

A propósito, When sunny get blues se diferencia no disco pela maciez do canto de Cássia e do toque da guitarra de Biglione. Essa balada-blues soa como standard jazzy da canção norte-americana.

Já Prison blues (Chris Farlowe e Jimmy Page, 1988) é tributo em que Biglione celebra Jimmy Page, guitarrista associado ao rock do grupo Led Zeppelin, em faixa de alta potência em que a voz de Cássia se afina com a guitarra do músico.

Outra incursão pelo repertório de grupos ingleses de rock é feita em Got to get you into my life (John Lennon e Paul McCartney, 1966), investida psicodélica dos Beatles no território do R&B e do soul. Biglione buscou dar tom lisérgico ao toque da guitarra.

Já I ain"t got nothing but the blues (Duke Ellignton e Don George, 1937), tema já ouvido na voz de Cássia em álbum ao vivo póstumo de 2012, é faixa em que cantora e guitarrista (então no toque de dois violões) pisam com propriedade no terreno rural do blues enraizado no solo afro-americano.

Enfim no mundo, após tantas especulações infundadas sobre a suposta má qualidade do disco, o álbum Cássia Eller & Victor Biglione in blues é atestado da grandeza do canto de Cássia Eller, artista que tinha o blues, entre outros tantos atributos.

Fonte: G1

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