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Disparada dos combustíveis: entenda as propostas para segurar os preços e por que cortar impostos pode não surtir o efeito desejado

Por G1 em 10/02/2022 às 15:20:26
Na leitura dos analistas, as medidas em análise não atacam as duas principais variáveis que mexem com o valor dos combustíveis – a cotação do petróleo e do dólar. Propostas também ampliam risco fiscal do país. A estratégia bancada pela ala política do governo Jair Bolsonaro, de cortar impostos para reduzir os preços dos combustíveis e do gás de cozinha, pode não surtir o resultado esperado.

Na leitura dos analistas, as medidas em análise não atacam as duas principais variáveis que mexem com o valor dos combustíveis – a cotação do petróleo e do dólar – e já se mostraram ineficazes no passado recente. Eles apontam também que as propostas aumentam a incerteza fiscal, uma vez que implicam em grande perda de arrecadação.

De Olho no Orçamento

Arte/g1

"Essa ideia da PEC dos combustíveis não faz sentido, porque é muito risco", afirma Alessandra Ribeiro, sócia e economista da consultoria Tendências. "É abrir mão de muita arrecadação por um benefício que é, no mínimo, duvidoso. Ou seja, é uma conta muito cara para uma ausência de certeza em relação ao seu resultado final."

Na prática, essa percepção mais negativa em relação às contas públicas pode se refletir numa nova rodada de desvalorização do real em relação ao dólar, o que traria mais inflação para o país e anularia os efeitos do corte de impostos no bolso dos consumidores finais.

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Propostas na mesa

Hoje, o país tem duas propostas de emenda à Constituição (PECs) e dois projetos de lei no Congresso Nacional que tratam de medidas para reduzir o preço dos combustíveis.

As PECs não receberam o aval da equipe econômica e têm potencial de gerar uma perda de arrecadação bilionária, que pode chegar a R$ 100 bilhões apenas para a União. No orçamento aprovado para este ano, o governo federal já trabalha com um déficit de R$ 79,3 bilhões. Ou seja, vai gastar mais do que espera arrecadar.

"O ambiente fiscal extremamente fragilizado do país faz com que as taxas de câmbio subam. E, no momento, reduzir o preço do combustível (por meio dessas PECs) será uma nova renúncia fiscal", diz Tadeu Barros, diretor-presidente do Centro de Liderança Pública (CLP). "É uma maior fragilidade para União, Estados e municípios. Se isso acontece, o dólar sobe ainda mais e a tendência é que o preço do combustível dispare", acrescenta.

Quais são as medidas em discussão?

PEC da Câmara

Apresentada pelo deputado Christino Áureo (PP-RJ), a proposta permite que União, estados e municípios reduzam ou zerem impostos sobre os combustíveis e o gás de cozinha em 2022 e 2023, sem medida de compensação. Também permite diminuir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Fontes do ministério da Economia calculam que a perda de arrecadação, apenas para a União, seria de R$ 54 bilhões em um ano.

PEC do Senado

De autoria do senador Carlos Fávaro (PSD-MT), autoriza União, estados e municípios a reduzir ou zerar impostos sobre diesel, biodiesel, gás e energia elétrica, em 2022 e 2023, sem precisar de medida de compensação.

Também cria um auxílio diesel de R$ 1,2 mil para caminhoneiros, com recursos que serão pagos fora do teto de gastos; aumenta de 50% para 100% o subsídio para as famílias de baixa renda na compra do gás de cozinha; e repassa R$ 5 bilhões para os municípios com o objetivo de mitigar a alta da tarifa do transporte público. O impacto fiscal para a União, no período de um ano, pode chegar a R$ 100 bilhões.

País tem duas PECs e dois projetos de lei que tratam de medidas para reduzir o preço dos combustíveis

Jefferson Rudy/Agência Senado

Fundo de estabilização

Cria um fundo de estabilização do preço do petróleo. Esse fundo seria composto por verbas federais, como royalties do petróleo e dividendos da Petrobrás, além da receita advinda de um novo imposto, que incidiria sobre a exportação do petróleo bruto. Os recursos seriam utilizados para compensar os períodos de alta na cotação do barril do petróleo. A proposta também é criticada pelo Ministério da Economia, que alega que seria necessário um volume muito expressivo de verbas federais para um resultado pífio nas bombas.

ICMS

O texto determina que o ICMS, principal imposto arrecadatório dos Estados, deixará de ser cobrado como uma porcentagem sobre o preço final do combustível. A proposta é de que o tributo passe a ser um preço fixo, em reais por litro. Esse preço seria definido uma vez por ano, pelos governos estaduais, e não poderia ultrapassar o valor médio dos últimos dois anos. O projeto é criticado pelos governadores, que afirmam que perderiam mais de R$ 20 bilhões em arrecadação no período de um ano.

Os preços viraram um problema

Enquanto governo e Congresso batem cabeça e economistas alertam para os efeitos fiscais das propostas em discussão, os preços seguem subindo nas bombas.

O litro da gasolina já chegou a superar os R$ 8 para o consumidor final, segundo os dados mais recentes da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

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Um problema que vem pesando no bolso do brasileiro desde o ano passado: em 2021, a inflação brasileira superou os dois dígitos pela primeira vez desde 2015 – e boa parte dessa alta foi impulsionada pelos preços dos combustíveis e do gás de cozinha.

A disparada nas bombas foi puxada pela valorização do barril de petróleo no mercado internacional e pela fraqueza do real. E não tem fácil solução, alertam os especialistas.

"Estamos diante de um preço de barril de petróleo alto e de um câmbio depreciado. Temos de tomar alguma atitude, porque corremos o risco de ter um caos social", afirma Adriano Pires, fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

"Quando o preço do diesel sobe, acaba influenciando nos caminhoneiros, os (preços dos) fretes. Além das tarifas urbanas de ônibus, que afetam muito a população de baixa renda", acrescenta.

Para Pires, o país deveria pensar em um conjunto de soluções. "Primeiro, temos de manter a liberdade de preços na refinaria, na distribuição e na revenda. Segundo passo, temos de fazer uma reforma tributária, não dá para cobrar ICMS do jeito que é hoje sobre combustível", diz.

E complementa: "Terceiro passo, precisamos voltar a ter um país que tenha uma taxa de câmbio mais condizente. Não dá para viver num país com taxa de câmbio acima de R$ 5. A gente tem, portanto, de recuperar a credibilidade econômica. E, por fim, eu advogo que deveríamos ter um fundo de estabilização para ser usado, apenas, em situações de alta volatilidade do barril do petróleo."

E como os preços são formados?

No governo Michel Temer, a Petrobras alterou a sua política de preços para seguir a paridade com o mercado internacional.

Os preços de venda dos combustíveis praticados pela estatal passaram a acompanhar a variação do valor do petróleo no mercado internacional e a variação cambial. Dessa forma, uma cotação mais elevada da commodity e uma desvalorização do real têm potencial para contribuir com uma alta de preços no Brasil.

A Petrobras é dominante no mercado. E, portanto, qualquer mudança adotada pela estatal produz impacto em toda a cadeia.

O valor dos combustíveis também é composto, em menor proporção, pelos tributos federais (PIS/Pasep, Cofins e Cide) e estadual (ICMS), além do custo de distribuição e revenda. Há ainda o custo do etanol anidro, que é adicionado à gasolina, e o valor do biodiesel, que compõe o diesel.

Composição dos preços

Arte/g1

Medidas sem efeitos

Desde o início do ano passado, o governo Bolsonaro vem lançando mão de uma série de medidas para tentar (sem muito sucesso) reduzir os preços dos combustíveis.

Relembre:

Fevereiro de 2021. Descontente com a alta dos preços dos combustíveis, Bolsonaro patrocinou a troca de presidente da Petrobras. Joaquim Silva e Luna assumiu o lugar de Roberto Castello Branco.

Março de 2021. Bolsonaro editou um decreto que zerou as alíquotas de PIS e Cofins que incidem sobre óleo diesel e gás de cozinha.

Abril de 2021. O governo anunciou a redução do percentual de mistura do biodiesel no diesel. O preço do biodiesel também avançou, porque tem a soja como sua principal matéria-prima.

Novembro de 2021. Pressionados pelo presidente, governadores anunciam o congelamento do ICMS. A medida foi renovada até março.

"Foi uma medida tentada pelos governadores, mas também não teve muito reflexo. Houve uma pequena redução do preço da gasolina e do diesel, no início de dezembro, mas porque houve uma queda do preço do barril no mercado internacional", afirma Pires.

Janeiro de 2022. Teve início o pagamento do auxílio gás. O benefício é de R$ 52, pago a 5,5 milhões de famílias.

Auxílio gás começa a ser pago a 5,5 milhões de famílias

Fonte: G1

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