Suspensão da regra que desonerava líderes religiosos abriu novo capítulo de desgaste com equipe econômica. Receita federalCrédito editorial: SERGIO V S RANGEL / ShutterstockA isenção à remuneração de pastores e líderes religiosos, suspensa pela Receita Federal nessa quarta-feira (17), já soma impacto de quase R$ 300 milhões aos cofres públicos.Relatório ao qual o blog teve acesso mostra que existem atualmente 26 processos administrativos e um judicial questionando a tributação. Enquanto tramitam, as cobranças são suspensas. Só o processo judicial discute R$ 177 milhões de impostos.Existem ainda quatro processos com a dívida reconhecida e mais 12 cujos débitos foram parcelados. Ao todo, R$ 293.753.452,97 não chegam aos cofres públicos por conta do impasse. O montante é suficiente para pagar o Bolsa Família a 428,4 mil famílias, considerando o valor médio de R$ 685,61 para o benefício.Bolsa Família 2024: pagamentos começam nesta quinta-feira; veja calendárioFoi esse relatório que motivou a Receita Federal a se antecipar à decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) e suspender temporariamente o entendimento anterior em relação à prebenda, valores pagos a pastores pelo tempo dedicado às igrejas. Eles agora passam a ser considerados remuneração e, sobre eles, passam a incidir tributos como o previdenciário. Em nota oficial, o órgão atribuiu a revisão da norma a uma "determinação do Ministério Público do TCU".DesgasteA justificativa apresentada pela equipe econômica para a mudança na tributação da remuneração dos pastores aprofundou o desgaste com o Congresso e pegou mal entre ministros do TCU (Tribunal de Contas da União).Entre os ministros da corte de Contas, o desconforto foi imediato. Embora haja de fato uma percepção de que a isenção abre brechas para abusos, o processo ainda está tramitando e não há nenhum despacho sobre o assunto do relator da matéria, ministro Aroldo Cedraz. Apesar dos apontamentos feitos pelo MPTCU de riscos ao erário, não cabe a ele nenhuma decisão e o relator, a quem cabe se manifestar, determinou antes a oitiva da Secretaria Especial da Receita.Por isso, a avaliação entre os ministros é de que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva jogou o TCU no meio da crise para se blindar com a bancada evangélica. Uma nota foi publicada no final da tarde de quarta-feira (17) para marcar posição.Ainda assim, a equipe econômica não conseguiu se blindar do desgaste com os parlamentares evangélicos, que também reagiram. Líderes do Congresso destacam que o ministro Fernando Haddad encerrou 2023 bem avaliado e conquistou vitórias como a reforma tributária, mas já acumula dois desentendimentos em 2024 antes mesmo do início dos trabalhos legislativos. Além da prebenda, senadores e deputados receberam mal a medida provisória revendo decisão sobre a desoneração de alguns setores da economia.Na Receita, fontes ouvidas pelo blog reconhecem que a nota atribuindo a revisão à "determinação do MPTCU" foi mal redigida, mas alegam ter ficado em uma sinuca de bico a partir das manifestações da corte de contas. Pareceres da área técnica e mesmo a representação do MPTCU alertam para os riscos de dano ao erário, diante dos quais a equipe econômica poderia ser acusada de prevaricação.Como o processo já se arrasta desde 2022 sem conclusão, a Receita optou por se antecipar à conclusão e suspender temporariamente o entendimento anterior até a manifestação final do TCU. Caso ao final do processo a corte entenda ser justificada a isenção sobre a prebenda, a Receita retomará a regra editada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.HistóricoO Secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, suspendeu uma decisão do governo Bolsonaro que garantiu isenção tributária sobre salários de ministros de confissão religiosa, como pastores.O Ato Declaratório Interpretativo que concedeu o benefício foi assinado por Julio César Vieira Gomes, às vésperas da eleição de 2022. Julio César é o mesmo que esteve envolvido na tentativa de liberação das joias dadas que o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou incorporar ao seu patrimônio.A concessão da isenção aos líderes religiosos foi considerada atípica porque não passou pelo crivo da subsecretaria de tributação da Receita.O Tribunal de Contas da União também estava investigando o procedimento de Julio Cesar.