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Por que os lucros da Petrobras são alvo constante de polêmicas com o governo

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Por G1 em 06/04/2024 às 11:36:26
Tesouro Nacional é o maior acionista e recebedor de dividendos da empresa. Mesmo assim, a lucratividade da estatal rendeu críticas dos governantes de diferentes espectros políticos nos últimos três anos. Exploração e extração de petróleo na P71 da Petrobras

Raoni Alves / g1 Rio

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, passa por um novo processo de "fritura", e volta a balançar no cargo. Nesta semana, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, não economizou nas críticas públicas à condução da empresa, disparando contra o trabalho do presidente e os lucros da estatal.

Mais uma vez, a lucratividade da empresa está no centro de um debate sobre o uso político da empresa. São duas linhas de pensamento:

Há quem acredite que a Petrobras deve servir aos interesses do governo, que é seu acionista majoritário;

E há quem entenda que a Petrobras é uma empresa de capital misto, que chegou onde está com apoio de investidores privados, e por isso não pode tomar decisões que prejudiquem sua lucratividade.

A origem da turbulência está (mais uma vez) na decisão da empresa de não pagar os dividendos extraordinários de 2023. A ordem de segurar o dinheiro em caixa veio do governo, mas Prates se colocou ao lado dos acionistas na defesa da distribuição de parte dos valores.

Dividendos são valores pagos aos acionistas com base nos lucros da empresa. E o não pagamento dos dividendos extraordinários, em março, gerou mal-estar no mercado, sendo interpretado como uma interferência política do governo na estatal.

Alexandre Silveira: Petrobras não pode ter único objetivo de "ter lucros exorbitantes"

Em entrevista à GloboNews nesta semana, Silveira disse que "não podemos admitir que a Petrobras tenha o único e exclusivo objetivo de ter lucros exorbitantes para poder distribuir aos seus acionistas".

"Agora, o que nós não podemos é deixar de fiscalizar, por exemplo, o que a diretoria da Petrobras está fazendo do ponto de vista do cumprimento do seu plano de investimento, aprovado pelo Conselho de Administração. Porque o grande objetivo do governo do presidente Lula é cuidar das pessoas", disse.

Dias depois, em entrevista ao jornal "Folha de S. Paulo", confidenciou que a relação é conflituosa e desconversou ao ser perguntado sobre como avaliava o trabalho de Prates.

A crítica aos lucros da Petrobras traz à memória a ofensiva de Jair Bolsonaro contra a empresa, em meio à alta dos preços dos combustíveis em 2021. Na ocasião, chamou o lucro recorde de "estupro" que beneficiava estrangeiros, e que a população brasileira é quem pagava a conta.

Bolsonaro diz que, se resolvesse, daria 'murro na mesa' da Petrobras para reduzir preços

Como o g1 mostrou em março, parece contraintuitivo que o governo federal fique contrariado com os lucros da Petrobras. Afinal, do bolo pago aos acionistas, o Tesouro Nacional recebe 37% do dinheiro, livres para incorporar ao orçamento.

Neste governo, a tese é a de que a verba em caixa passa uma imagem de maior vigor financeiro da Petrobras. E isso é importante em um momento em que o governo quer que a empresa adote uma estratégia de aumentar os investimentos, com captação de financiamentos no mercado.

No governo passado, a lógica era o controle de preços de gasolina e diesel — dois dos itens que mais pesavam em uma inflação galopante. A Petrobras ainda operava pela política de paridade de importação (PPI), e acompanhava a crise de oferta e a alta de preços vindas da pandemia de Covid, em 2020, e intensificada pela guerra entre Rússia e Ucrânia, em 2022.

Alvaro Bandeira, coordenador da Comissão de Economia da APIMEC Brasil, afirma que o interesse de Lula e Bolsonaro sempre foi o mesmo: manejar os recursos da companhia.

Bruno Oliveira, analista da AGF, compartilha da mesma visão e destaca que os dividendos da Petrobras são uma alternativa para que os governos consigam manter ou colocar em prática os seus projetos políticos. "No fim do dia, é uma medida de populismo", comenta.

Ações da Petrobras caem mais de 7%, após Bolsonaro criticar política de preços da empresa

Mas seja para aquecer a economia ou para controle de preços, trata-se de um uso político de uma empresa de capital misto — ou seja: parte estatal, parte privada. E sempre que o poder público força a mão, os investidores que colocaram dinheiro na abertura ao mercado ou em aumento de capital ficam contrariados.

Pedro Rodrigues, sócio e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), faz coro à impressão de que a gênese do desconforto com os lucros da Petrobras está na natureza jurídica da empresa de capital misto.

"As confusões acontecem sempre que há um desarranjo de subida do preço do barril do petróleo. Qualquer acionista de petroleira comemora, mas o da Petrobras não, porque ele sabe o que vai acontecer", diz o especialista.

Ele entende que independentemente do governo em questão, há um conflito permanente entre o que a classe política, a sociedade e o mercado financeiro entendem do objetivo da empresa.

"O que não pode é ter lucro explorando o público, ou praticando preços de monopólio — ainda que a Petrobras domine o refino. Mas, em geral, vemos uma prática de preços de mercado. É uma questão de ressignificar que o lucro é ruim", afirma Rodrigues.

'Não posso enriquecer o acionista e empobrecer a dona de casa', diz Lula sobre preços da Petrobras

Outra curiosidade: o último aumento de capital relevante da empresa, inclusive, foi realizado por Lula, em 2010.

Lá atrás, apostando no potencial de exploração de petróleo no pré-sal, o governo Lula 2 organizou uma operação de venda de novas ações ao mercado — diminuindo a fatia do governo — para arrecadar recursos para ampliar investimentos.

Em outras palavras: o governo levou acionistas privados a investirem novamente na empresa, que esperam lucros e dividendos no futuro. Sempre que há frustração, as ações mergulham e a empresa perde valor de mercado.

Aconteceu agora, mas também quando Bolsonaro trocou os presidentes da Petrobras por três vezes. (relembre no vídeo abaixo)

Relembre as trocas na presidência da Petrobras durante o governo Bolsonaro

O economista Roberto Castello Branco presidiu a companhia do início do mandato de Bolsonaro, em 2019, até fevereiro de 2021. Foi demitido por conta da insatisfação do presidente com os reajustes nos preços dos combustíveis.

Bolsonaro também demitiu o militar Joaquim Silva e Luna e seu sucessor, José Mauro Coelho, pelo mesmo motivo. Em maio, Caio Paes de Andrade foi indicado e lá permaneceu até o fim do mandato. Só teve paz quando o governo aprovou o teto do ICMS, que combateu a alta dos combustíveis por meio de renúncia fiscal.

A cada movimento, as ações da Petrobras viviam em uma montanha-russa. Subiam quando havia alta do barril do petróleo, mas logo despencavam pela imprevisibilidade de possíveis intervenções do governo.

Durante as eleições de 2022, também sofreu flutuações quando Lula falava em "nacionalizar" os preços de combustíveis praticados pela Petrobras, e que "não pode enriquecer o acionista e empobrecer a dona de casa". (relembre no vídeo acima)

No mês passado, essa mesma sensação de intervenção motivou a queda foi de 10% em um dia por conta da crise dos dividendos extraordinários.

O mercado não vislumbrava investimentos benéficos para a empresa, e esperava que os valores fossem distribuídos. Até mesmo alas do governo preferiam a distribuição. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apoia a distribuição, justamente para manter viva a meta de zerar o déficit público.

Para Oliveira, da AGF, o problema da Petrobras é que, apesar de ter funcionários "muito competentes", quem tem o poder de bater o martelo nas decisões da companhia são os governantes. E é isso que, de tempos em tempos, alimenta o sentimento de imprevisibilidade dos negócios.

"Se você é acionista de uma empresa e não consegue dormir em paz, é hora de revisitar esse investimento", afirma.

Fonte: G1

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